segunda-feira, maio 18, 2009

Livro Da Semana

 

clip_image002O Erro De Descartes, António R. Damásio

 

Estamos no ano de 1848. O calor aperta na Nova Inglaterra (Estados Unidos da América), o ar condicionado não existe e a multidão refresca-se como pode.

Phineas P.Gage não se pode dar a esse luxo: excelente “capitão” de uma equipa de trabalhadores encarregados de construir o futuro comboio que atravessará a cidade de Vermont, divertido, bem-disposto, um líder nato, bom colega de trabalho, é considerado pelos seus patrões o homem mais eficiente e capaz que se encontra a trabalhar para a Companhia Rutland & Burlington.

Mas este destino promissor irá mudar para sempre: no dia 13 de Setembro, um terrível acidente de trabalho marcará a história da Neurologia. Uma barra de ferro entra pela face esquerda de Gage, trespassa a base do crânio, atravessa a parte anterior do cérebro e sai a alta velocidade pelo topo da cabeça (ver segunda imagem). Gage aterra no chão a mais de trinta metros de distância do local do acidente e, para espanto de todos, está vivo e consciente. Horas depois, caminha, fala, ouve muito bem, consegue ver (se bem que apenas de um dos olhos) e parece estar na posse das suas faculdades.

Mas, como dizem os nossos avós, “quando a esmola é grande, o pobre desconfia”: a personalidade amável e profissional de Phineas Gage esfumou-se. Tornou-se um homem caprichoso, egoísta, insensível aos problemas dos outros, utilizava uma linguagem cheia de palavrões e insultos extremamente agressivos, e não durou muito tempo para ser despedido, por “conduta imprópria”. Acabou os seus dias num bairro de má reputação, alcoólico, epiléptico e irascível. Tinha 38 anos de idade.

Foram precisos mais de 100 anos para que todas as peças deste puzzle se começassem a unir: Elliot, um paciente de António Damásio sofreu um acidente bastante semelhante ao de Gage. Para espanto de todos, os sintomas foram exactamente os mesmos: mudança repentina da personalidade, agressividade, ausência de sentimentos bons, um intelecto perfeitamente preservado. Foi a partir deste momento que Damásio começou a colocar uma hipótese: e se as emoções são as grandes criadoras do ser humano?

Somos educados a pensar que as emoções são, no geral, negativas.clip_image004 A Razão, pelo contrário, sempre foi glorificada. As nossas avozinhas sempre nos ensinaram que as pessoas “com cabecinha” vão longe e a mente torna-nos mais inteligentes, mais humanos. Quanto aos outros que se deixam levar pelas emoções, esses são uns “totós”, uns fracos que não sabem controlar o seu destino. Pelo menos era assim que todos nós pensávamos, graças a um filósofo chamado Descartes: “Penso, logo Existo”, dizia ele. O corpo só funcionava porque a mente era dona e senhora dele. O corpo era um pacote para alma, nada mais.

No entanto, e através de muitos relatos coleccionados de acidentes de trabalho e de estranhas lesões cerebrais, os neurologistas não só compreenderam que a nossa mente é um aglomerado de zonas interligadas entre si como, inclusivamente, conseguiram detectar qual é a zona da fala, a zona do movimento, das memórias, das emoções, entre muitas outras.

E descobriram, completamente espantados, uma verdade que há cinquenta anos atrás seria inconcebível: são as emoções que nos ensinam a escolher os bons caminhos e as boas decisões da nossa vida, ao contrário da razão e da lógica. Este livro prova cientificamente que a “razão do coração” é correcta e real, não é uma história de contos de fadas e de pirosices de novelas da TV. Este livro explica-nos como o cérebro humano funciona, que partes do mesmo estão envolvidas na criação das emoções e das nossas escolhas pessoais, que “explosões químicas” ocorrem quando passamos por períodos de dúvida e de contemplação. E mostra-nos A+B que quem tem a última palavra é sempre a “Senhora Dona Emoção”, não a chata, altiva e arrogante “Doutora Razão”.

Afinal, os nossos avós é que eram sábios: segue o teu coração.

Quanto ao coração ser um segundo cérebro… Bem, essa é matéria para outro texto.

S:C:

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