quinta-feira, outubro 08, 2020

Para ver e Pensar - Também a Chuva, de Icíar Bollaín



No próximo dia 12 de outubro celebra-se o Día de la Hispanidad, feriado nacional de Espanha, que comemora a chegada de Cristóvão Colombo às Índias Ocidentais, a descoberta do Novo Mundo que era o que hoje conhecemos como continente americano. Tal como os descobrimentos portugueses, são-nos hoje contadas histórias gloriosas, ou glorificadas, dos feitos heróicos que ocorreram: enfrentar mares revoltos, tempestades, tribos hostis e até monstros imaginários. Mas terá sido a realidade assim tão gloriosa?

Coincidentemente (ou não…), apenas três dias depois do feriado nacional de Espanha, no dia 15 de outubro, será celebrado o Dia Mundial da Resolução de Conflitos. Parece ser coisa pouca – estes dias especiais não parecem resolver nada -, mas há dias que nos fazem pensar e refletir. Sejamos honestos: até que ponto é difícil sararmos feridas e recomeçarmos de novo, sem os fantasmas do Passado e do Presente?

Já cantava Elton John: A palavra “desculpa” parece ser a mais difícil de dizer. E, no entanto, este filme não está apenas a tentar expor um conflito do passado, ainda tão vivo no século XXI: ao mesmo tempo, deixa bem claro que a escravidão nunca acabou, simplesmente mudou de rosto e de táticas. Hoje, já não é comum em muitos países vermos um Humano amarrado e acorrentado, a ser vendido numa praça. Contudo, o que é que vocês acham que é o “trabalho infantil”? O que é que vocês pensam que é o “trabalho à jorna”? O que é que vocês pensam que a Apple é, quando coloca grades nas janelas das suas fábricas, para impedir que os seus escravos-a-fazer-de-conta-de-que-são-trabalhadores não possam cometer suicídio? Aliás, a inteligência desta corporação mortífera é tão boa que eles nem sequer têm fábricas, pagam “o serviço” a outros carrascos. Assim, a Apple não poderá ser acusada de maus tratos aos trabalhadores, pois pode sempre alegar desconhecimento…

Também a Chuva ganhou em 2010 o Óscar do melhor filme estrangeiro e foca dois tempos: a chegada de Cristóvão Colombo e o genocídio que os índios sofreram, como consequência da dita cuja “Cristianização”, e foca o ano de 2000, quando os Colombianos declararam guerra à corporação Americana Bechtel, uma companhia que supostamente devia distribuir a água a todos os nativos deste país, mas decidiu, de um dia para o outro, vender a água da torneira a preço de petróleo. Estas duas batalhas – uma do século XVI e outra do século XXI – fundem-se numa sala de cinema escura, um espaço onde atores, realizadores, músicos, pessoal de limpeza e restante público se encontram. Este é um lugar que foi criado (sem dúvida!) para entreter, mas também foi criado para refletir e mudar. E sarar feridas. E resolver conflitos.

Deixamos em baixo um pequeno trecho do filme, para aguçar o apetite. Prestem muita atenção à cena do afogamento das crianças. Reparem no olhar do “Homem Branco”, ainda arrogante o suficiente para achar que a “sua cena” é mais importante do que outras coisas. E o olhar do Índio, que não quebra, e que é de opinião de que há certas coisas que nunca poderão ser dramatizadas.

Por muito boas que as intenções sejam.

 

Trecho do filme También la Lluvia (sem legendas) - Aqui



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