terça-feira, dezembro 06, 2011

Muito cuidado com estes novos “jornalistas”

 

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No final do mês passado, o canal de televisão CNN despediu cerca de 50 jornalistas e correspondentes profissionais porque, segundo o mesmo, a chegada da internet e das notícias fresquinhas, captadas por amadores entusiastas, tornou este grande número de repórteres “irrelevante”. Como resultado, Stephen Colbert (imagem em baixo), um dos maiores comediantes americanos do momento, arrasou a CNN e profetizou

uma queda de qualidade nos futuros noticiários da mesma.

É verdade que a internet democratizou a informação, e é verdade também que permitiu a chegada de novos talentos. Para o comprovar, há inúmeros blogs, sites e podcasts que se tornaram marcas de qualidade, e que são hoje uma referência, goste-se ou não, atual. O caso mais famoso em Portugal é o site dedicado ao ensino A Educação do meu umbigo, da autoria de Paulo Guinote. Porém, lá porque alguém tem um ipad “modernaço” ou uma voz cativante, tal não quer dizer que qualquer um possa ser candidato a jornalista. Com efeito, até podemos saber contar muito bem uma piada e cativar uma grande audiência. Porém, isso não faz de nós atores nem comediantes.

Para todos os efeitos, são precisos anos de estudo, de prática e de pesquisa para que alguém se possa considerar um jornalista a sério. Precisamos, para começar, de saber distinguir a diferença entre rumor e um fato que merece ser analisado; precisamos de saber escolher as fontes de informação; precisamos de saber selecionar a diferença entre o supérfluo e o importante; precisamos de saber transmitir a notícia de uma forma que seja clara, objetiva, e o mais imparcial possível. Por fim, precisamos de ter o tal “instinto”, de forma que a nossa notícia seja relevante para os dias de hoje. E isto não é trabalho para qualquer um.

A título de exemplo, deem uma espreitadela ao vídeo que abaixo escolhemos: em Junho deste ano, o mundo da internet acordou extasiado, ao descobrir que uma suposta “aparição” de uma cidade flutuando nas nuvens tinha aparecido numa vila chinesa. O vídeo transformou-se numa espécie de vírus e, em menos de dois dias, já todo o mundo tinha ouvido falar deste fenómeno paranormal.

clip_image004 Ora bem: “quando a esmola é grande, o pobre desconfia”. E foi isso mesmo que um fotógrafo australiano, de nome Auki Henry, pensou. Sacou do mapa desta vila, comparou-o com os vídeos… e não demorou muito para desmantelar esta dita cuja “miragem”: os edifícios sempre estiveram ali (as fotos podem ser vistas aqui) .Pior ainda, os pseudo-jornalistas que “investigaram” esta história não trouxeram nenhum intérprete profissional com eles. Se o tivessem feito, depressa teriam chegado à conclusão de que os transeuntes estavam maravilhados com o efeito de ótica e não com o tão falado milagre: todos eles disseram que os edifícios, graças às cheias que ali ocorreram, faziam lembrar um reino de fadas. Nenhum deles afirmou que aquela miragem era um reino de fadas, como a notícia inicial dizia (o filme original foi retirado do Youtube). Para todos os efeitos, eles não apareceram do nada, como se uma porta dimensional qualquer tivesse sido aberta.

E é precisamente aqui onde reside o problema: estes “amadores entusiastas” carecem de experiência, de profissionalismo e de estudo. Acham que chegar a um local com uma câmara é publicar uma notícia. E normalmente tendem a pegar em histórias que raras vezes correspondem à verdade, e nem sequer sabem como pesquisar e investigar a veracidade das mesmas. Se até os próprios jornalistas profissionais caem em erros de palmatória (lembram-se do famoso “Arrastão” de há uns anos atrás?), pior ainda será para os amadores.

Longe estamos dos bons velhos tempos em que a BBC, o canal público da Inglaterra, preferiu confirmar a veracidade dos campos de concentração nazis antes de publicar a notícia na televisão e, por isso mesmo, estes jornalistas foram dos últimos a transmitir esta notícia ao público. Uma coisa é certa: se o verdadeiro jornalismo decidir optar por este caminho – satisfazer um exército de anónimos sequiosos de 5 minutos de atenção, em vez de apostar na qualidade – o jornalismo terá os seus dias contados.

Felizmente os grandes jornais e revistas de referência nacional e mundial preferem continuar a ser “uma cambada de elitistas sem vergonha”. E aqui entre nós, fazem eles muito bem.

Artigo de opinião da autoria de Sandra Costa

A Dita “cidade vinda do nada” (notícia confirmando a ilusão de ótica)

 

Stephen Colbert arrasa a CNN (sem legendas) Aqui

Imagens retiradas de:  1   e   2

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