Para aqueles que nunca ouviram falar desta expressão, “sair do armário” é uma frase que serve para descrever a coragem de pessoas vindas de grupos socialmente discriminados ou indivíduos que possuem ideias ou comportamentos que não são bem vistos pela maioria, e que finalmente arranjam forças para assumir publicamente aquilo que são ou fizeram ou fazem: sim, sou gay/lésbica; sim, tornei-me muçulmano (ou budista ou cristão, dependendo do país em que estamos); sim, sou feminista; sim, sou alcoólico; sim, eu abortei; entre muitos outros exemplos.
Actualmente, a minoria que está a dar que falar é a dos “novos ateus”: fartos de serem discriminados e insultados nos Estados Unidos da América, arregaçaram as mangas, juntaram-se e agora a sua voz e ideais estão a criar polémica e escândalo nas terras dos Tio Sam.
Isto, para um português, é extremamente confuso e estúpido: por que motivo alguém que não acredita em Deus (a palavra “ateu” significa exactamente isto) é escorraçado e desprezado pela sua sociedade? Afinal, acreditar ou não na existência de uma entidade superior que criou o universo e os homens não passa de uma questão de fé ou não-fé. Não se pode provar cientificamente que ela existe e não se pode provar cientificamente que ela não existe. Uma vez que estamos em situação de empate, para quê a confusão?
Infelizmente, o 11 de Setembro e a queda das torres gémeas desencadeou nesta primeira década uma onda de fanatismo religioso. As religiões voltaram a entrar em guerra umas contra as outras, o mundo tem estado a pagar um preço muito caro por isso, a Ciência tem sido fortemente e brutalmente atacada, e países que, tradicionalmente, já são muito religiosos, tornaram-se ainda mais adeptos da fé em Deus. É o caso dos Estados Unidos da América. Para piorar ainda mais o cenário, o penúltimo presidente desta nação, George Busch, um “novo religioso” insuportavelmente fanático, levou oito anos a misturar Fé com política, a ponto de interferir em tudo, até no sistema de ensino. Actualmente, alguém que queira concorrer para um emprego tem obrigatoriamente que preencher uma alínea: “a que religião pertence?”. Se não colocar lá nenhuma, poderá ficar desempregado para sempre, porque os ateus são, desde há muito tempo, vistos como sendo pessoas imorais e adeptas de Satanás. E, para acabar com chave de ouro, a Europa e o mundo estão a importar estas ideias: países como a França, a Inglaterra, a Holanda, a Alemanha, a Itália e até a nossa vizinha Espanha estão a ser alvo de pressões de grupos religiosos cada vez mais intolerantes e cada vez mais intrometidos. O fanatismo religioso tornou-se um cancro que está a contaminar o planeta inteiro e, por enquanto, Portugal tem escapado desta vaga de loucura.
Fartos de serem insultados e humilhados, os ateus, como já dissemos acima, arregaçaram as mangas, uniram-se e agora já não se calam, nem que a voz lhes doa. Escrevem livros, lançam debates, dão conferências, fazem música, e muitos já estão, finalmente, a “sair do armário”. Ora, um programa de televisão verdadeiramente pioneiro e revolucionário foi o The Atheist Experience, que já dura há cerca de 11 anos. Inicialmente, o público era tão pequeno e os apoios eram tão poucos, que os seus programas eram passados em tvs piratas. Porém, com a explosão do Youtube e o apoio crescente de muita gente (até de muitos religiosos tolerantes, que já não têm paciência para os extremismos das suas fés), The Atheist Experience tem sido cada vez mais uma hora de grande desconforto para os fanáticos religiosos.
Basicamente, são duas pessoas ateias à frente de uma câmara, que atendem telefonemas vindos de todos os lados... e há cada louco que lá aparece! Há chamadas que se tornaram lendas vivas: uma senhora que acredita em milagres porque rezou a Deus para que a chuva parasse e (DAH!) aconteceu; um espectador que não acredita que o corpo humano tenha electricidade porque, se fosse assim, seríamos electrocutados no duche (esta é a mais famosa de todas!); um espectador que assumiu em público que Deus é quem manda, e se Ele lhe pedisse para matar os filhos, assim o faria; entre muitos outros exemplos. Porém, convém dizer aqui que The Atheist Experience não é um programa imparcial: o objectivo inicial foi apoiar os ateus que viviam escondidos, incentivá-los a assumir publicamente as suas ideias, explicar ao público a razão porque não acreditam em Deus e promover o debate entre religiosos e não-religiosos. E há muitos momentos em que assistimos a discussões bastante acaloradas entre crentes e não-crentes!
Ao fim de onze anos de luta, o programa tornou-se mais maduro e mais sereno, o público tornou-se mais vasto e já não são só os “maluquinhos da religião” que fazem os telefonemas e que mandam e-mails para insultar os “anti-heróis” da América. Podemos dizer que The Atheist Experience, de certa forma, tem desempenhado um bom serviço público: tem vindo a deitar por terra a ideia feita de que os ateus são monstros que comem criancinhas. E num mundo cada vez mais religioso e cada vez mais intolerante, shows como este não são apenas necessários, são cruciais para nos fazerem pensar, para nos ensinarem a questionar as nossas próprias ideologias, e para nos mostrar até que ponto as mesmas podem afectar negativamente ou positivamente as nossas vidas e as vidas dos outros.
Vejam estes videos e divirtam-se (ou melhor, chorem...).
O corpo não pode ter electricidade porque, se tomarmos banho, seremos electrocutados
Como Ensinar Um Fanático Religioso a Usar a Google