O sal da terra, de Miguel Real
Muito já se tem dito e escrito sobre a vida e obra de Padre António Vieira. Aliás, Fernando Pessoa descrevia-o como sendo o “imperador da Língua Portuguesa”. A verdade é que, independentemente de gostarmos ou não dos seus livros e sermões, não podemos deixar de admirar um homem que nunca desistiu de lutar pela justiça e pela verdade, que nunca se calou perante os grandes, que esteve sempre do lado dos injustiçados e dos oprimidos e que confiou cegamente nos potenciais do seu país.
Este era um homem que acreditava ferozmente no papel preponderante da nossa nação, não como opressora bélica, mas como força transformadora e criadora da igualdade de todos, através do poder do Espírito Santo. O Quinto Império, com efeito, foi a grande obsessão da sua vida, a ponto de só lhe trazer dissabores e constantes ataques da Inquisição. Portugal era visto como um farol de luz e sabedoria, o centro do nosso planeta.
Miguel Real, o autor desta obra, decidiu escrever um livro que contasse a vida deste fabuloso jesuíta e, como a contra-capa deste romance afirma, O Sal da Terra descreve a vida aventurosa do padre António Vieira entre o Brasil e Portugal: uma vida farta de sonhos nacionalistas até 1667 e carregada de desilusões até à sua morte, em 1697. Em vida Vieira vê-se a si próprio como o português mais fracassado de todos os tempos – nada do que sonhara se cumpriu, todas as suas profecias se frustraram, todos os seus planos políticos se goraram. Afinal, toda a sua glória foi póstuma.”
Este é um livro que não pretende ser literário. O seu objetivo é proporcionar boas horas de entretenimento e prazer e, como quem não quer a coisa, ficarmos a conhecer o Portugal e o mundo do século XVII. Miguel Real tenta ser cuidadoso na forma como descreve as civilizações deste mundo já desaparecido, e tenta sempre colocar-se na pele de Vieira. Estamos ainda muito distantes da carta dos direitos humanos, do sonho da democracia, da igualdade das mulheres, da liberdade religiosa e do direito à nossa sexualidade.
Olhando para trás, apercebemo-nos que já percorremos um longo caminho, embora ainda falte muito para ser cumprido. O sonho de Vieira era um sonho de cariz religioso e político, o paraíso era cristão e “frescuras” como os direitos dos animais ou a concepção da reencarnação ser-lhe-iam completamente alienígenas. No entanto, ele foi para a sua época um homem que acreditava na dignidade humana, no poder do estudo e dos livros e foi, acima de tudo, um ser humano extremamente moderno e humanista. Como eram, aliás, os jesuítas.
Para quem está a estudar a História de Portugal ou a aventurar-se pelos caminhos do Sermão de Santo António aos Peixes, O Sal da Terra é um excelente cartão de boas-vindas à vida e obra deste grande “Imperador da Língua Portuguesa”.
1 comentário:
O mundo está a precisar de homens e mulheres com a fibra de Vieira. Já não se fazem pessoas assim...
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