Escrever um livro ou um poema é uma “profissão” mal desejada e mal amada. Tirando alguns casos muito excepcionais (e que, muitas vezes, nada têm a ver com Literatura) viver das palavras é bilhete de ida para a fome e para o desprezo da sociedade. Não se vive da escrita.
O escritor é um ser amaldiçoado. Amaldiçoado porque a verdadeira Literatura incomoda-nos, obriga-nos a pensar. Amaldiçoado porque o livro não é bem-vindo num mundo onde a imagem é tudo e a palavra encontra-se esvaziada de sentido e de emoções. Usámos e abusámos dos termos “Amor”, “Solidariedade”, “Tolerância”, entre muitos outros. Hoje, as palavras são uma nota de rodapé que só serve para legendar uma garrafa de Coca-Cola, o novo par de ténis da Reebok ou o novo modelo de um carro. Deixámos de brincar com os trocadilhos, com os sons da língua, deixámos de usar a ironia, deixámos de moldar o nosso vocabulário como se fosse um pedaço de mármore prestes a ser esculpido. Estamos espiritualmente mais feios, emocionalmente mais infelizes, socialmente mais autistas.
No vasto oceano dos facebooks e dos twitters, uma pequena e silenciosa minoria teima em ser diferente e vai lançando às novas gerações o bichinho da leitura e da escrita. Não fazem barulho, não dão nas vistas, não partem carros nem montras, não fazem comícios nem manifestações à porta dos governos. Mas é fácil detectá-los: estão numa esplanada lendo e escrevendo. Estão num centro comercial, na ala das crianças, escolhendo em conjunto com o petiz o novo “brinquedo” que será lido em família. É o adolescente esticado na relva a saborear as palavras; é o turista, emocionado, a escrever o seu diário. São seres silenciosos mas apaixonados; tímidos mas luminosos; educados mas incómodos. São os “esquisitos” que não bebem até cair, os “anti-sociais” que amam mais a Humanidade do que muita gente pensa. É o vizinho “bicho-do-mato” que diz baixinho “bom dia” a quem passa, de jornal enrolado no ombro. E é sempre deles que virá a revolução.
O escritor encontra-se numa mesa de um café. Observa o mundo à sua volta, as velhas e as novas almas, os amargurados e os felizes, os gordos e os envergonhados, a mãe cansada e o filho a pedir atenção, o casal que não troca uma palavra, o empregado esgotado que diz “bom dia” sem olhar para o cliente, a mulher grávida e o seu sorriso de água. O barulho dos carros de uma pessoa só. O casal de namorados que brinca com o seu cão.
O bloco de notas surge do nada, o papel vazio procura uma ideia.
Escreve.
Imagens retiradas de:
http://cultura.updateordie.com/2010/01/25/como-planejar-para-escrever-seu-livro-parte-1/
http://osentidodascoisas.blogspot.com/2009_05_01_archive.html
2 comentários:
Se dividíssemos este post em três fatias, eu diria que concordo com a 2ª e a 3ª, mas não com a primeira.
Não acho que, nos dias que correm, os escritores sejam menosprezados. pelo menos não tanto como eram, embora ainda haja muito quem ache que ser escritor não é uma profissão, mas isso haverá sempre.
Mas está aqui um comentário inspirador.
Ana:
Depende do que hoje em dia se considera "um escritor". No mês de Setembro, a montra da Bertrand ( Não estamos a falar de uma montra de supermercado!)tinha tudo menos livros de literatura. E a "obra principal" era a nova edição da Alexandra Solnado.Se isto é respeito pelas letras...
Obrigada pelo comentário e volte sempre! ;)
Sandra Costa
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