Crónica do Rei Pasmado, Gonzalo Torrente Ballester
- Viste coisa mais bela?
-Há muitas coisas belas no mundo.
-Mais do que o corpo de uma mulher?
- Se é o de Marfisa, dificilmente.
-Até ontem à noite, nunca tinha visto uma mulher nua.
- E então?
- O paraíso tem que ser uma coisa semelhante.
- Não creio que os senhores inquisidores gostassem dessa ideia.
-Que saberão os senhores inquisidores de mulheres nuas?
E é assim que o fascínio de Filipe IV, rei de Espanha terceiro rei de Portugal, começa: ao deitar-se uma noite com a prostituta mais bela, mais cara e mais famosa de toda a Espanha, descobre, completamente aparvalhado, que nunca na sua vida tinha visto uma mulher inteiramente nua. E o desejo de conhecer a beleza natural do “belo sexo”, leva-o ao ponto de achar que tem o direito de ver a sua própria mulher (a rainha!) sem as respectivas indumentárias!
A rainha, essa, acha a ideia deveras marota e divertida. Mas os padres da Inquisição; os defensores da moral e dos bons costumes; uma classe de nobres com mais medo dos padres do que das espadas; e, por fim, todo um rígido e asfixiante conjunto de regras e tradições, a seguir num palácio “de gente decente”… Tudo, enfim, conspira contra o rei e a rainha que, por mais artimanhas e estratégias que encontrem para estarem sozinhos, nunca conseguem fazer aquilo que qualquer casal feliz devia estar a fazer: a divertirem-se na sua privacidade. E nus, de preferência.
É então que uma compreensiva superiora de convento, a meretriz Marfisa e o próprio diabo até (!) decidem fazer a vontade aos dois monarcas…
Delirante e imperdível, eis uma obra literária que se lê sempre com prazer. Especialmente nestes dias de frio e névoa, que só nos faz desejar estar em casa, frente a uma lareira…
2 comentários:
Belíssimo livro e um filme encantador. De antologia os diálogos entre "Deus e o Diabo". lbasilio
Óptima escolha! É um livro "de pasmar". Vale a pena, aliás, conhecer melhor a obra de Gonzalo Torrente Ballester.
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