Para quem nunca ouviu falar deste tipo de poesia, o Haiku japonês nunca tem mais do que três versos de 5/7 sílabas cada (claro que esta harmonia perde-se com a tradução). O objectivo é atingir a perfeição e a paz através da simplicidade absoluta: menos é mais.
A primeira parte do poema é descritiva e contemplativa, ao passo que a segunda parte já se debruça sobre uma determinada acção/reacção. Quanto à conclusão, esta tem que criar impacto no leitor e transmitir-lhe a sensação de um definitivo ciclo que termina: início, desenvolvimento, fim. Um poema Haiku perfeito, lida a última estrofe, tem que representar um círculo sublime, sem falhas: se ficarmos a “chorar por mais”, então a obra poética não está equilibrada e a perfeição não se atingiu.
Apresentamos aqui as quatro estações vistas pelo poeta Basho (1644-1694), um dos nomes mais brilhantes da poesia japonesa e deste género de poesia.
PRIMAVERA
Apesar da névoa
Mesmo assim é belo
O Monte Fuji
Não esqueças nunca
O gosto solitário
Do orvalho
Brisa ligeira
A sombra da glicínia
Estremece
Debaixo de uma cerejeira
Tudo é servido
Decorado com flores
Extingue-se o dia
Mas não o canto
Da cotovia
Depressa se vai a Primavera
Choram os pássaros e há lágrimas
Nos olhos dos peixes
VERÃO
Preso na cascata
Um instante
O Verão
Um peixe
Nuvens arrastam-se
No leito da ribeira
Frescura
Os pés no muro
Ao dormir a sesta
Num atalho da montanha
Sorrindo
Uma violeta
Silêncio
As cigarras escutam
O canto das rochas
Ervas no estio
Eis o que resta
Do sonho dos guerreiros
OUTONO
A pequena lagarta vê passar
O Outono sem pressa
De se tornar borboleta
Trevos roxos ondulam
Sem deixa cair
Uma só gota de orvalho
Admirável aquele
Cuja vida é um contínuo
Relâmpago
Na escuridão do mar
Brancos gritos
De gaivota
Acabou-se o óleo da lamparina
Mas eis a Lua
Que entra pela janela
Outono
Empoleirado num ramo seco
Um corvo
INVERNO
Primeira neve
Basta um floco para vergar
A folha do junquilho
Um vento glacial sopra
Os olhos dos gatos
Pestanejam
Mesmo um velho cavalo
É belo de manhã
Sobre a neve
Oh, anda ver
Uma bola de neve
A arder
Primeiro aguaceiro de Inverno
Meu nome será
Vagabundo
Deixem-me caminhar
Até que tropece e desapareça
Na neve
Estes poemas foram seleccionados do livro "O Gosto Solitário do Orvalho" de Matsuo Basho, editado pela Assírio e Alvim em 1986. O texto introdutório retira informações do prefácio de Jorge de Sousa Braga.
Os poemas foram retirados do site
1 comentário:
Lindo, lindo, lindo...
Pela minha parte...obrigada!!!
Lyta
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