A História Interminável, de Michael Ende
Ora aqui está uma grande obra-prima do género fantástico que, durante quase vinte anos, esteve fora das estantes de Portugal. Há cerca de vinte anos, este romance de aventuras fez um sucesso de tal forma estrondoso que até virou filme (péssimo, péssimo, péssimo…). Os dois actores miúdos ficaram ricos e famosos de um momento para o outro, o Justin Bieber lá do sítio fez uma canção que, durante semanas, esteve nos tops de todos os países, não havia gato-pingado que não andasse com este romance na mão e depois… nada. Absolutamente nada. Se alguém quisesse comprar esta história incrível tinha que escarafunchar bem escarafunchado todos os alfarrabistas da nossa nação. Ou comprar na internet. Ou herdar dos pais. Mas agora já podemos redescobrir o prazer de entrarmos no reino dos sonhos, onde as imperatrizes são crianças e os dragões são parte desta realidade.
E quem não gostaria de ser como o Bastian, uma criança curiosa e tímida que entra num alfarrabista e dá de caras com um estranho livro que parece estar à espera dela? De facto, este objecto possui uma força de atracção tal que o menino não o hesita em roubar e, mal chega a casa, começa a devorá-lo. Porém, à medida que vai folheando as suas páginas, apercebe-se que este é uma porta dimensional para algo mais. É um chamamento, um convite para uma demanda: descobrirmos quem realmente somos nós. Bastian fica tão fascinado que não hesitará em entrar nesse mundo mas tudo dependerá das decisões que tomar: o lema “Faz o que Quiseres”, logo à entrada do reino Fantastica tem muito que se lhe diga. Mas Bastian depressa descobrirá que fazermos o que quisermos não significa “fazermos qualquer coisa”:
- Só podes descobrir os caminhos de Fantasia - disse Graograman - através dos teus desejos. E só podes ir de um desejo para outro. Aquilo que não desejas é inatingível para ti. É esse o significado das palavras perto e longe neste lugar. E também não basta quereres ir-te embora de um lugar. Tens de querer ir para outro. Tens de deixar que os teus desejos te conduzam.
Depois de vinte anos de ausência, finalmente alguém tem o bom senso e o bom gosto de reeditar esta belíssima história para crianças dos oito aos oitenta anos. A História Interminável pode figurar lado a lado com O principezinho. Estes livros são muitas vezes erradamente confundidos com contos de fadas para a pequenada, e tal não pode ser mais injusto: este livro fala-nos do crescimento interior e da descoberta de nós mesmos, fala-nos da importância da responsabilidade e do mal que as nossas acções podem fazer aos outros, fala-nos da importância dos sonhos, do quão importante é sonharmos de olhos abertos e preservarmos a criança que existe em todos nós. Porque sem ela estamos condenados a uma morte espiritual. Seremos máquinas esvaziadas de sentido, sem projectos e já sem chama.
Triste o adulto que já não consegue voar para o mundo dos sonhos.
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