sexta-feira, dezembro 10, 2010

Obras Intemporais Que Deveríamos Ter Na Nossa Estante

 

Ler um livro é sempre uma coisa bastante subjectiva: aquela obra que nós achamos que é excelente pode muito bem ser vista pelo nosso amigo ou familiar como sendo uma monumental “chatice”, um “pincel” que, muitas vezes, foi engolido à força clip_image002(caso seja obrigatório ler na escola) ou algo que foi logo pousado para um canto (caso tenha sido comprado ou oferecido). Mas há livros que, por mais que os detestemos, temos que engolir em seco e admitir que, em termos de qualidade literária, são excelentes.

O que é, afinal, uma obra-prima literária? Talvez uma das suas grandes características resida no facto de que uma obra-prima, não importa quantos séculos lhe passem à frente, continua a ser lida e publicada por sucessivas gerações de ávidos leitores. É o caso de clarões de génio como, por exemplo, A Arte de Amar, de Ovídio; Crime e Castigo, de Dostoievsky; Madame Bovary, de Gustave Flaubert; Romeu e Julieta, de William Shakespeare; entre muitos outros exemplos, inclusivamente de autores portugueses. Aquilo que é bom é sempre eterno. Pode até ser temporariamente esquecido mas, anos depois, é redescoberto e volta a brilhar como mil cometas fulgurantes.

Hoje iremos falar de uma grande obra-prima que se encontra, infelizmente, esquecida por muitos. E trata-se de um pequeno gigantesco conto.

O Silêncio do Mar, de Vercors

Escrito durante a II Guerra Mundial, O Silêncio do Mar conta a história enternecedora mas muito triste de um soldado alemão que, após a invasão à França, tenta estabelecer um diálogo cheio de afecto com um tio e a uma sobrinha. Os seus camaradas de armas, à boa maneira dos povos invasores, limitam-se a tomar uma casa que não lhes pertence e passam a morar ali, sem sequer pedir licença. Orgulhosos e patriotas, esta pequenina família composta por apenas dois seres, toma uma decisão: continuarão a fazer a sua vida como se os alemães não estivessem lá. Ele fuma tranquilamente o seu cachimbo, ela borda e tricota como se nada fosse. E é neste silêncio rebelde que se estabelece uma estranha comunicação entre dois franceses e um oficial nazi.

Werner não é igual aos outros: sonhador e músico, ele sente uma verdadeira paixão pela França. Acredita muito ingenuamente que a união entre a França e a clip_image003Alemanha irá criar um futuro radioso para o mundo, Porque a Alemanha possui a ordem, a disciplina e a música, mas a França possui a sensibilidade, o génio e a Literatura. Serão o casal perfeito, a união sacralizada por Deus. E, todas as noites, Werner sentar-se-á ao lado do tio e da sobrinha. Falará, falará, falará. Contará a história da sua vida, a história da sua querida Alemanha, o amor intenso que sente pela França. Não esperará deles uma única palavra, um único aceno. E sentirá que as coisas devem ser assim mesmo. Trata-se de um namoro, fazer a corte à amada. É preciso conquistar os franceses, convencê-los. Dominá-los, nunca.

Chega, finalmente, a hora de conhecer todos os camaradas que irão ocupar a França. Ele parte, entusiasmado, deslumbrado. Vai conhecer a sua querida “capital das luzes”, o mundo nunca será o mesmo… E quando volta, volta diferente. E volta de tal forma diferente que, em vez de continuar a tentar comunicar com os dois franceses, começa a evitá-los, cheio de tristeza e decepção. O que viu e ouviu destruiu os seus sonhos: a Alemanha não quer conquistar a França, quer destrui-la.

E, antes de partir, Werner desce à sala. E confessa tudo o que lhe vai na alma.

Escrito por um francês em plena época da Resistência, Werner não é uma personagem inteiramente ficcional: o autor da novela (o seu nome verdadeiro é Jean Bruller) inspirou-se num oficial verdadeiro que também ocupou a sua casa e, através de um diálogo cheio de silêncios, Bruller apercebeu-se que o soldado também amava a sua nação e não desejava destruí-la.

Esta novela emociona-nos até às lágrimas e marca-nos a ferro e fogo para o resto das nossas vidas. Já foi adaptada para dois filmes (vejam o cartaz acima. Não sabemos se o filme tem legendas em Português) mas, é claro, não há nada que substitua a leitura desta obra-prima. Além disso, está ao gosto de muitos leitores portugueses, que têm horror ao tamanho dos livros: é pequenina e lê-se no máximo em duas horas.

O Silêncio do Mar é um Hino ao Amor e à Resistência sem sangue e sem vingança. O ódio só gera o ódio. E, por vezes, um silêncio profundo como o mar impõe-se mais do que uma arma.

Imagens retiradas de: 1 e 2

1 comentário:

Roberto disse...

Adoro este conto. É muito pequeno mas,como costumamos dizer, «Quantidade não é Qualidade». É uma pequena gema da Literatura.