segunda-feira, junho 01, 2009

Livro da Semana

 

clip_image002As Vinhas da Ira, de John Steinbeck

As palavras que actualmente mais ouvimos e lemos, assim que abrimos uma televisão, uma rádio, um jornal, uma revista ou um blog, são as palavras “Crise Mundial”, “bolha”, “Crash”, “Bolsa de Valores”, “especulação”, entre outras. Talvez para os mais distraídos e para os jovens, estes termos sejam uma verdadeira novidade, especialmente se tivermos em conta que, pela primeira vez, muitos adolescentes já ouvem os pais dizerem “não” a muitos luxos ou mimos que lhes pedem. Passou a ser uma regra de ouro em todas as casas portuguesas apertar o cinto, desligar a luz dos quartos desocupados, fechar a torneira de água, parar de fumar, cortar nas despesas supérfluas… E rezar para que nenhum dos cônjuges seja despedido do seu emprego.

Porém, para os mais atentos e mais instruídos, a palavra Crash (que, em inglês, significa “queda”, “quebra”, “choque”, “embate”) provoca muitas más memórias, todas elas ligadas a um dos dias mais negros da História do Século XX.

Corria o ano de 1929 e parecia que tudo dançava ao som de uma orquestra formidável: o admirável mundo novo criado pelos americanos suscitava a inveja mundial. Os americanos estavam todos eles ricos e prósperos, todos tinham acções, carros, casa própria, terrenos, rádio, comida na dispensa (não estamos, obviamente, a incluir as minorias étnicas. Essas sempre foram pobres e discriminadas). Até que numa terça-feira do dia 24 de Outubro (a célebre Quinta-feira Negra”) um homem, que ainda hoje ninguém sabe quem foi, entra na Bolsa de Valores bastante exaltado, e pede para que as suas acções sejam imediatamente postas à venda. Pelo menos, esta é uma das lendas urbanas que se contam para aí…

E é então que o pânico se instala no mundo inteiro: como um jogo de dominó, cada país arrasta o outro para a falência e, de um dia para o outro, gigantescas fortunas entraram em colapso. Diariamente as pessoas atiravam-se dos prédios e muitas morriam literalmente à fome, deixando-se ficar estendidas nas ruas, até a senhora morte as vir buscar. À noite, recolhiam-se os cadáveres, enquanto os vivos dormiam. O desespero era tal que chegava-se inclusivamente a arrancar as pedras das ruas para as poder vender no mercado negro. O Grande Crash da Quinta-feira Negra deixou traumas irreversíveis nas bolsas de valores, e basta, actualmente, um pequeno número de acções começar a cair dia após dia, para os corretores começarem a suar frio. Concluindo, a Crise Mundial de hoje é apenas uma das muitas que já apareceram e, por enquanto, não se compara nem um pouco à de 1929 (para quem ficou interessado neste tema, consultem a excelente página da revista brasileira Veja: http://veja.abril.com.br/historia/crash-bolsa-nova-york/especial-quebrou-panico-acoes-wall-street.shtml). clip_image004

O que é que tudo isto tem a ver com o livro da semana? Muito simples: As Vinhas da Ira contam precisamente o desespero de uma família de agricultores que, não tendo dinheiro para pagar ao banco as suas propriedades, é literalmente escorraçada da sua casa. Juntamente com milhares e milhares e milhares de famílias na mesma situação, decidem rumar até ao paraíso prometido: a Califórnia, terra da fartura e das laranjeiras que, de tão cheias, dão para encher a barriga de milhões de crianças, mulheres, velhos, adultos. Entusiasmados, compram uma carripana a cair aos bocados e metem-se a caminho deste novo Eldorado. A “Estrada 66”, uma gigantesca auto-estrada que percorre os Estados Unidos da América de uma ponta à outra, tornou-se lendária e símbolo da luta e do sonho. Take the Route 66 tornou-se uma canção emblemática, escutada com amor e esperança por ricos e pobres (http://www.youtube.com/watch?v=dCYApJtsyd0). Ao longo do livro, estes miseráveis são explorados, enganados, espancados, humilhados por tudo e todos. A “Terra das Oportunidades” não dá, afinal, oportunidades a todos… E a família Joads vê-se, pouco a pouco, destruída e mutilada.

E há personagens que nos marcam para sempre, particularmente a mãe Joads, que faz tudo por tudo para que a família não se desintegre, e assiste, cada vez mais resignada, ao fim da sua vida segura e tranquila. O fim desta história é um fim aberto: a jovem Rosaharn, depois de descobrir que o filho que pariu estava morto, oferece o leite dos seus seios a um velho moribundo, um dos muitos também expulsos das suas terras. É impossível ler este livro sem chorarmos, nem que seja uma só vez. Não estamos a falar de números, de estatísticas, estamos a falar de pessoas, de dramas reais que efectivamente tiveram lugar naqueles dias.

clip_image005John Steinbeck teve sérios problemas, graças a este libelo anti-capitalismo: acusado de ser comunista (um dos piores insultos que se pode dizer a um americano), o governo e os poderosos, picados por se reconhecerem nesta obra-prima, tentaram destruir-lhe a vida e a carreira. Em vão: Steinbeck ganhou o prémio Pulitzer, um dos mais prestigiados prémios que se podem dar a um escritor. E ganhou o prémio Nobel. E ganhou o respeito. E ganhou a imortalidade…

E tão actual, que este livro é…

Imagens retiradas de:

Revista Veja (já mencionada acima)

http://www.designlessbetter.com/blogless/tags/the-new-economy

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