segunda-feira, outubro 19, 2020

Livro(s) da semana - Coleção Padre Brown, G. K. Chesterton

É graças à excelente adaptação para televisão do canal BBC one (imagem em cima) que muitos portugueses descobriram este padre muito especial: um homenzinho curvado, de óculos grossos e olhar penetrante, sempre carregando o seu guarda-chuva, andando de bicicleta, sempre atento aos problemas da sua vilazinha adorável.

E, no entanto, o escritor G. K. Chesterton teria dificuldades em reconhecer esta versão moderna da sua personagem! O padre Brown dos livros difere bastante daquele que vemos na televisão: sim, é verdade que este “servo de Deus” está muito atento aos problemas sociais do século XX: a pobreza, a discriminação, a crueldade, a guerra, a ganância, os refugiados, etc. Podemos assumir que – no geral – padre Brown tem inclinações “socialistas”. No entanto, ele não deixa de ser um conservador católico: a sua relação com os ateus pode ser de respeito, mas é de grande desconfiança e, sobretudo, critica cultos ligados a Wiccas, novas eras, etc. Além disso, o humor do verdadeiro padre Brown é mais irónico, menos “explosivo”, mais sóbrio. Para terminar, as suas investigações são solitárias: não há Lady Felicia, não há Mrs. Mccarthy, não há inspector Mallory.

Padre Brown foi inventado numa altura em que a Igreja Protestante Inglesa era muito “Anti-Papista”, muito anti-Católica. G.K.Chesterton desejava falar de “um outro olhar”, um olhar pós modernista, pós guerra. O seu desejo era criar uma personagem que, apesar de ter assistido a duas guerras mundiais sangrentas, continuava a acreditar em Deus, e usava a força de Deus para combater o crime, sem nunca perder o seu raciocínio científico e dedutivo. Para isso, baseou-se num padre católico da vida real, O Reverendo John O’ Connor, para criar um imaginário que, inicialmente, era anglicano. Aos poucos, tornou-se católico. E Chesterton tanto investigou a fé católica, que acabou por se converter a ela!

Apesar das diferenças, podemos afirmar que a “adaptação moderna” do Padre Brown é uma das poucas que consegue ser criativa, sem ser “politicamente correta”. Mais ainda, evita politizar os seus episódios, o que é uma mais-valia nos tempos de hoje. Quanto aos livros, vale a pena conhecer o verdadeiro Brown: um homem extraordinariamente inteligente, muito humano, muito “iluminado”. Um homem de pensamento complexo e raciocínio arguto, alguém que vê com olhos de ver e ouve com ouvidos de ouvir.

Algo que só um padre a sério sabe fazer.

 

Imagem retirada de:

https://filmow.com/padre-brown-1a-temporada-t76232/ficha-tecnica/

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